Por Mario Mele
Adultos que praticam esportes desde criança sentem na pele os efeitos benéficos dessa escolha. Se você é um desses, certamente quer propagar essa sua escolha às próximas gerações. E há boas justificativas para isso, assinadas embaixo pela ciência.
Recentemente, o site da ISPO, a maior feira do mundo voltada a roupas e artigos esportivos, publicou uma entrevista com dois especialistas alemães da área de esportes e psicologia infantil para entender como as atividades físicas promovem a saúde mental de crianças e adolescentes.
Manuel Föcker (consultor sênior do Departamento de Psiquiatria Infantil e Adolescente, Psicossomática e Psicoterapia do Hospital Universitário de Münster, Alemanha), e Matthias Marckhoff (cientista esportivo) investigaram os efeitos da pandemia de Covid-19 em relação aos esportes e ao bem-estar psicológico em jovens entre 11 e 17 anos.
Todos sabemos que a quarentena fez com que os esportes despencassem do cronograma de atividades na maioria das pessoas, principalmente os mais jovens, que estão no auge da fase escolar. E o pior: um quarto, aproximadamente, simplesmente entrou no “modo sedentário”, abandonando de vez qualquer prática.
O mais revelador no estudo conduzido por Föcker e Marckhoff é que, enquanto essas crianças e adolescentes voltaram-se mais às telas de seus computadores, tablets e celulares, seu bem-estar psicológico simplesmente foi arruinado. Outros pesquisadores, como o norte-americano Richard Louv, já haviam alertado sobre a importância da natureza no desenvolvimento emocional de crianças e jovens (leia mais sobre isso abaixo).
Resgatamos a seguir algumas declarações que a dupla de pesquisadores alemães deu ao site da ISPO para explicar a importância dos esportes para a saúde mental e o desenvolvimento intelectual na infância. E também mostrar o quanto a prática esportiva nesse período da vida potencializa a capacidade de lidar com situações adversas, algo que será levado até a fase adulta.
O efeito dos esportes nas crianças
“Exercícios, brincadeiras e esportes influenciam a saúde mental das crianças em três níveis”, diz Marckhoff:
Föcker complementa: “Há estudos mostrando que a atividade física regular ajuda no desenvolvimento de diversas regiões do cérebro, através de uma proliferação celular melhorada. Esses efeitos de crescimento costumam ter impacto positivo no desempenho cognitivo e nas funções motoras, além de estarem intimamente relacionados aos processos de regulação emocional. Devido à alta adaptabilidade, a neuroplasticidade do cérebro na infância e na adolescência é fortemente influenciada pelos esportes e exercícios físicos.”
O esporte e os recursos de enfrentamento da criança
Segundo os mesmos pesquisadores, o quão bem uma criança vai atravessar uma crise vai depender dos recursos de enfrentamento disponíveis a ela. E o esporte dá essa base pelos seguintes motivos:
A pesquisa indicou também que os esportes — principalmente os de maior intensidade — colaboram para minimizar e até reverter os quadros de depressão em crianças e adolescentes.
Em suas análises, Marckhoff e Föcker comprovaram que níveis frequentes de atividades físicas estão associados ao bem-estar psicológico. Em outras palavras, os pais que durante a pandemia conseguiram manter seus filhos na ativa, ajudaram a prevenir crises de ansiedades, algo que é muito recorrente a crianças que não têm oportunidade de extravasar de alguma forma.
Contato com a natureza é importante
Há uma corrente forte de pesquisadores e estudiosos ressaltando sobre a importância de atividades ao ar livre para as crianças. Já faz um tempo também que, sem pretensão, o escritor Richard Louv acabou cunhando o termo “nature déficit disorder” (ou “distúrbio de déficit de natureza”). Em seu livro A Última Criança na Natureza, Richard chamou a atenção de pais e educadores sobre a influência positiva da natureza na vida e no bem-estar (físico, emocional e social) das crianças.
Nesta obra, o autor resgata esse elo perdido, mostrando o quanto a relação criança-natureza é benéfica ao promover transformações significativas. Louv, que não é contra a tecnologia no processo educacional, acredita que o segredo seja o equilíbrio.
“A floresta foi a minha Ritalina”, escreveu Louv, se referindo ao medicamento utilizado no tratamento de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, em crianças e adultos. “A natureza me acalmou, me focou e ainda estimulou meus sentidos. ”
Ainda segundo ele, uma educação com base no meio ambiente ajuda os alunos a perceberem que a escola não é uma forma de encarceramento, mas um portal para um mundo mais amplo.
Dicas para manter as crianças na ativa
Marckhoff e Föcker, pelo visto, também sabem da importância de estar ao ar livre, assim como da dificuldade que tem sido fazer com que as crianças não fiquem em casa paradas durante a pandemia. Com clubes, academias e outros meios de socialização praticamente inviáveis, virou um desafio “arranjar o que fazer”. Por isso, dão dicas para os pais driblarem esse inconveniente. E as crianças, claro, agradecem.
Segundo Marckhoff e Föcker, mesmo que os esportes praticados sozinho ou em família não exerçam os benefícios da socialização, pessoas que se movimentam com frequência se sentem melhor e se tornam mais preparadas para lidar com as crises. Resumindo, de uma forma ou de outra, as atividades físicas são sempre benéficas.
Esportes e a aprendizagem
Os mesmos pesquisadores asseguram a influência positiva dos esportes em nossas habilidades de aprendizagem. “Especialmente no desenvolvimento da primeira infância, o exercício físico define impulsos importantes para o desenvolvimento do cérebro”, relataram. É algo, inclusive, que já foi provado em outros estudos com animais, em que o esporte auxiliou na formação de novas células nervosas.
Na prática, é notada uma maior capacidade de concentração e controle de atenção. Por outro lado, outras pesquisas constataram que a falta de atividades físicas gera deterioração dessas áreas cerebrais.
A infância molda o comportamento da fase adulta
Não é preciso ser nenhum especialista para dizer que as experiências vividas na infância ficam gravadas de maneira duradoura. Para Marckhoff e Föcker, é preciso ficar sempre atento à frequência de atividades físicas — sem exagero, claro. No entanto, a falta de exercícios nessa fase da vida pode ter, no longo prazo, influência considerável no estilo de vida relacionado à saúde.
O esporte deveria integrar políticas de saúde
Para os pesquisadores alemães, o esporte tem, sim, um alto valor terapêutico, e inclusive já faz parte de diversos tratamentos médicos.
Mais importante ainda é que os esportes estão diretamente associados à prevenção de saúde. “É aqui que as escolas e os clubes desempenham o papel central”, dizem os pesquisadores.
É mais uma prova, portanto, do quanto é necessário garantir a prática esportiva de crianças e adolescentes em períodos de isolamento social.
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